05/02/2024
Milhares de empresas estão a receber notificações da Autoridade para as Condições do Trabalho (“ACT”), para verificação da potencial existência de vínculos laborais relativamente a prestadores de serviços cujo volume de facturação a tais empresas tenha excedido os limites a partir dos quais se considera existir dependência económica.
Neste contexto, relembramos que que se considera existir dependência económica quando mais de 50% do valor total anual da actividade do trabalhador independente é prestado a uma mesma entidade.
As notificações que as empresas estão a receber decorrem precisamente do cruzamento de dados entre a ACT e a Segurança Social, sendo identificados os trabalhadores independentes relativamente aos quais, à luz do referido critério, se considere existir dependência económica.
De acordo com as notificações que estão a ser remetidas, as empresas dispõem de um prazo até 16 de Fevereiro de 2024 regularizar o vínculo laboral dos “falsos” trabalhadores independentes, nomeadamente (i) informando os trabalhadores da alteração do vínculo (para contrato de trabalho, (ii) realizando a competente comunicação da qualificação à Segurança Social.
A recepção de uma das referidas notificações deverá ser encarada com as devidas cautelas, pelo que deixamos abaixo um breve Q&A que visa ajudá-lo a reagir no caso de ter sido um dos destinatários das mesmas:
O facto de ter recebido a notificação significa que sou obrigado a reconhecer o trabalhador independente como trabalhador subordinado da empresa?
Não. As notificações foram enviadas para entidades que beneficiem da actividade de prestadores de serviços relativamente aos quais exista dependência económica. Sendo este um dos indícios da existência de uma relação laboral, não é o único nem o determinante, pelo que deverá ser feita uma análise caso a caso da forma como é prestada a actividade pelo prestador, que permita avaliar da existência de uma relação laboral.
Neste contexto, relembramos que o critério fundamental para aferir se a relação entre um prestador de actividade e um beneficiário da mesma assume natureza laboral é a existência de subordinação jurídica. De acordo com o Código do Trabalho, presume-se que existe um contrato de trabalho quando se verifiquem algumas das seguintes características:
- A actividade é realizada em local pertencente ao beneficiário ou por ele determinado;
- Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem ao beneficiário da actividade;
- O prestador da actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinados pelo beneficiário da mesma;
- Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade;
- O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.
Quais as consequências para a empresa no caso de efectivamente se concluir pela existência de um contrato de trabalho e não se proceder à regularização da situação?
As consequências poderão não ser automáticas, mas a ACT poderá desencadear à verificação das situações com vista a apurar a natureza da relação laboral.
Salientamos que a ACT dispõe de amplos poderes de fiscalização e controle da actividade das empresas em matéria laboral e que a prestação de actividade de forma aparentemente autónoma em condições características de contrato de trabalho constitui uma contra-ordenação muito grave, punível com coimas cujos montantes podem variar entre € 2.040,00 e € 61.200,00, dependendo do volume de negócios da empresa e do grau de culpa.
Em caso de reincidência, poderão ainda ser aplicadas ao empregador as seguintes sanções acessórias:
- Privação do direito a apoio, subsídio ou benefício outorgado por entidade ou serviço público, designadamente de natureza fiscal ou contributiva ou proveniente de fundos europeus, por período até 2 anos;
- Privação do direito de participar em arrematação ou concursos públicos, por um período até 2 anos.
Pelo pagamento das coimas podem ser solidariamente responsáveis os gerentes, administradores ou directores.
Para além da responsabilidade contra-ordenacional, podem ainda estar em causa pagamentos aos trabalhadores que seriam devidos no caso desde o início da prestação de actividade a relação ter sido assumida como sendo de natureza laboral, designadamente, pagamento de subsídios de férias e de Natal e outras quantias que decorram da legislação aplicável aos contratos de trabalho ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
A equipa de Laboral da VCA tem ampla experiência na análise e qualificação da natureza da relação jurídica entre prestadores de actividade e os seus beneficiários e no patrocínio de empresas em matéria contraordenacional laboral.